Depósito realizado em curso de ação sobre rescisão contratual não configura adimplemento substancial e não afasta inadimplência do comprador de imóvel. Decisão é da 2ª câmara de Direito Privado/MT, ao entender que atraso no pagamento de três parcelas constitui motivo para rescisão por parte da incorporadora.
Consta nos autos que as partes celebraram contrato de compra e venda de apartamento no valor de R$ 195 mil. O termo continha previsões sobre mora contratual e, segundo o contrato, o atraso no pagamento de três parcelas constituiria motivo para a imediata resolução contratual caso o devedor não purgasse a mora em até dez dias após notificação. Em agosto de 2011, foi firmado termo de confissão de dívida entre as partes, tendo o comprador assumido débito de R$ 148,6 mil. Apesar disso, o comprador obteve a posse do imóvel.
No ano seguinte, a incorporadora notificou-o sobre a existência de 10 prestações em aberto, as quais não foram pagas dentro do prazo. Em virtude disso, a incorporadora moveu ação com intuito de rescindir o contrato.
O juízo da 6ª vara Cível de Cuiabá ponderou que já no trâmite processual o apelado depositou R$ 110 mil com a intenção de demonstrar interesse na aquisição do imóvel. Em virtude disso, em 1º grau, foi julgado improcedente o pedido da construtora, já que o juízo considerou que o depósito no curso do processo configura adimplemento substancial. Contra a sentença, a incorporadora interpôs recurso.
Descumprimento de obrigação
Ao analisar o caso, a relatora na 2ª câmara de Direito Privado do TJ/MT, desembargadora Clarice Claudino da Silva, ponderou que, conforme a doutrina, para a aplicação da teoria do adimplemento substancial, não é suficiente a análise quantitativa do cumprimento da obrigação pelo devedor. No entanto, segundo a relatora, é imprescindível que a conduta do devedor no curso da execução contratual tenha se pautado de acordo com os ditames de boa-fé.
A magistrada salientou que, mesmo após ser imitido na posse, o comprador deixou de pagar a contraprestação, e também não honrou as obrigações pecuniárias relativas ao uso do imóvel, como IPTU e taxa de condomínio.
Segundo a desembargadora, mesmo tendo condições financeiras para dispor do montante depositado em juízo, de R$ 110 mil, “o Apelado não se valeu do prazo concedido pela Apelante quando da noti?cação para purgar a mora ou manteve contato para tratativas amigáveis visando solucionar a pendência”.
Conforme a relatora, quando do ajuizamento da ação, o adimplemento contratual se circunscrevia à importância de R$ 66 mil, o que corresponde a apenas 33,8% do valor total devido pelo comprador.
Assim, ao seguir por unanimidade o voto da relatora, a 2ª câmara de Direito Privado do TJ/MT deu provimento ao recurso da incorporadora. Dessa forma, o colegiado afastou o adimplemento substancial, permitindo a rescisão contratual por culpa do comprador e determinando que o valor a ser pago pelo apelado será apurado em fase de liquidação de sentença.
“Sendo o caso típico de descumprimento contratual do comprador que, constituído em mora, deixou transcorrer o prazo para purgá-la ou, ao menos, tentar solucionar o impasse, é de rigor a rescisão do Contrato de Compra e Venda, retornando-se ao status quo ante, com a retomada da posse do imóvel pela alienante, inobstante tenha efetuado depósito de parte do débito no transcorrer da demanda, o qual foi impugnado pela vendedora.”