A arbitragem é um dos Métodos de Solução Adequada de Conflito (MASC), tendo como objetivo zelar pela autonomia da vontade das partes de uma relação contratual, oportunidade em que ambas acordam estabelecer a participação de uma terceira pessoa alheia ao negócio jurídico, que será responsável por solucionar potencial controvérsia que, eventualmente, venha a se verificar na relação então pactuada.
A Lei de Arbitragem (lei 9.307/96) institui diretrizes acerca de regras e procedimentos arbitrais, os quais serão observados de forma conjunta aos ditames próprios de instituições autônomas especializadas em solução de conflitos, denominadas “Câmaras Arbitrais”.
Em alguns casos, visando maior celeridade e poder de escolha no procedimento formal e material de solução de eventuais conflitos oriundos dos contratos celebrados, as partes decidem por eleger a Câmara de Arbitragem, renunciando a atuação do poder judiciário para a solução de conflitos do negócio incluindo a chamada “cláusula de compromisso arbitral”, regulada pelo artigo 4º da Lei de Arbitragem, acima mencionada. Referida cláusula consiste em um acordo entre as partes, formalizado através de um instrumento assinado, em que ambos os contratantes entendem por bem se submeter à arbitragem caso venha a ocorrer algum conflito naquele acordo.
Atualmente, a jurisprudência majoritária do Superior Tribunal de Justiça caminha no sentido de decidir pela manutenção da cláusula arbitral prevista no contrato celebrado entre duas partes.
Contudo, algumas decisões recentes vêm questionando essa massiva conduta jurisprudencial, sob o argumento utilizado pelas próprias Câmaras Arbitrais, no que tange à limitação de custas procedimentais ao valor máximo de R$ 100.000,00 (cem mil reais), sob pena de se declinar sua competência para resolução da lide.
A exemplo disso, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, especificamente a 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial, especializada em demandas arbitrais, decidiu pelo afastamento da cláusula arbitral em uma relação de franquia (processo nº 1107427-98.2021.8.26.0100).
A fundamentação do Tribunal consistiu na lógica de que o que existe, em verdade, na relação entre franqueadora e franqueada, é a imposição de cláusula arbitral, ou seja, a franqueada não possuiu a prerrogativa de discutir ou negociar a adoção da cláusula arbitral no momento da assinatura do contrato.
Nesse sentido, ainda que o instrumento assinado por ambas as partes esteja investido de aparente legalidade quanto à sua forma, pois respeitou o artigo 4º da lei 9.307/96 (lei de arbitragem), o fato é que o cumprimento dessa legalidade não afasta completamente eventual abuso de direito, tendo em vista que a anuência e consequente estabelecimento de um procedimento arbitral é custoso e pode, na visão do desembargador Ciampolini, ultrapassar os limites econômico-sociais, da boa-fé e dos bons costumes, isso tudo tendo em vista a disparidade entre a razão financeira da franqueadora frente à franqueada.
Logo, deve-se aguardar pelas próximas decisões emitidas pelo Poder Judiciário, com a finalidade de verificar se tal entendimento restará consolidado, principalmente pelas Câmaras Especializadas do TJ/SP, que vêm validando a cláusula arbitral mista, limitando a competência do Tribunal Arbitral, de modo a afastá-la nos casos em que verificada a hipossuficiência de uma das partes.
Bruna Barbosa Dias