A Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça, no dia 11/09/2019, em julgamento de Recurso Especial Repetitivo nº 1.729.593, referente ao Tema 996, fixou quatro teses jurídicas visando uniformizar o entendimento no tocante às obrigações originadas de contrato compra e venda de imóvel na planta no âmbito do programa Minha Casa, Minha Vida, quais sejam:
“1 – Na aquisição de unidades autônomas em construção, o contrato deverá estabelecer de forma clara, expressa e inteligível o prazo certo para a entrega do imóvel, o qual não poderá estar vinculado à concessão do financiamento ou a nenhum outro negócio jurídico, exceto o acréscimo do prazo de tolerância.
2 – No caso de descumprimento do prazo para a entrega do imóvel incluído o período de tolerância, o prejuízo do comprador é presumido, consistente na injusta privação do uso do bem, a ensejar o pagamento de indenização na forma de aluguel mensal, com base no valor locatício de imóvel assemelhado, com termo final na data da disponibilização da posse direta ao adquirente da unidade imobiliária.
3 – É ilícita a cobrança de juros de obra ou outro encargo equivalente após o prazo ajustado no contrato para a entrega das chaves da unidade autônoma, incluído o período de tolerância.
4 – O descumprimento do prazo de entrega do imóvel computado o período de tolerância faz cessar a incidência de correção monetária sobre o saldo devedor com base em indexador setorial, que reflete o custo da construção civil, o qual deverá ser substituído pelo IPCA, salvo quando este último for mais gravoso ao consumidor”.
Vale ressaltar, que se firmou o entendimento de que as disposições debatidas recaem sobre os imóveis adquiridos, desde que tenha, tão somente, a finalidade de residência própria. Isso porque, a Lei 11.977 de 2009, que dispõe sobre o programa Minha Casa, Minha Vida não contempla os imóveis adquiridos para fins comerciais ou a título de investimento.
O voto apresentado pelo relator, ministro Marco Aurélio Bellizze, que fora tido como entendimento unânime pelos demais colegiados, considerou, no Enunciado I, que as incorporadoras não podem fixar um prazo estimativo para a entrega do imóvel à data da obtenção do financiamento pelo adquirente, uma vez que este estará vinculado a um evento futuro, oportunidade em que atribui o direito de postergar a entrega da obra, ou seja, determinando um prazo extenso e oneroso para o adquirente.
Noutro ponto, o Enunciado II dispõe sobre o entendimento no tocante ao prejuízo presumido do promitente comprador para fixação de lucros cessantes em razão do descumprimento do prazo para entrega do imóvel, mesmo que o bem tenha sido adquirido mediante financiamento do Sistema Financeiro Habitacional (SFH) ou pelas normas do programa Minha Casa, Minha Vida, uma vez que, nesse caso, independe a finalidade negocial da transação, bem como incorrerá na responsabilidade pelo atraso para entrega do imóvel diante de uma relação de consumo promitente-vendedora e adquirente.
No mais, quanto aos juros de obras, apresentados no Enunciado III, não são considerados abusivos no caso de as cláusulas contratuais preverem a cobrança dos juros antes da entrega das chaves. Todavia, em caso de sobrexceder o prazo para conclusão do empreendimento, os juros de obras não poderão ser cobrados visto que houve atraso por culpa exclusiva da incorporadora.
A última tese apresentada refere-se à correção monetária do saldo devedor nos casos de descumprimento de prazo de entrega dos imóveis, em que será possível a substituição do indexador setorial, pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor (IPCA), exceto nos casos em que o Índice Nacional de Custo de Construção (INCC) for mais favorável ao consumidor, com o intuito de apresentar um equilíbrio na relação contratual.
Nesse cenário, conclui-se que os enunciados fixados pelo Superior Tribunal de Justiça possuem grande relevância para os conflitos entre os consumidores e as incorporadoras no Poder Judiciário, uma vez que tramitavam em todo o país uma média de oito mil ações com temas semelhantes aos debatidos, as quais aguardavam desde 2016 por estas decisões.
Isabela Maria de Godoy